por Ana Maria Otoni Mesquita
Título: Irei quando tempo estiver bom
Série coreana em 16 capítulos
Plataforma: Netflix
Elenco: Park Min-young, Seo Kang-jun, Moon Jeong-hee, Lee Jae-wook
Criação: Han Ji-seung, Han Ga-ram
Irei quando tempo estiver bom – um elogio reconfortante à literatura
Certa vez, quando perguntaram a Carlos Drummond de Andrade o significado de escrever, ele foi breve: é a minha psicanálise.
Nada mais próximo dessa definição, do que a série coreana na Netflix, "Irei quando o Tempo estiver bom", e o faz com muita poesia e beleza. Aos mais apressados informo que ela é lenta, no ritmo dos goles de uma caneca de café bem quente num dia de inverno.
Mok Hae-won (Park Min-young), violoncelista e professora em uma escola de música em Seul, decepcionada com a frieza da vida na cidade decide voltar a sua cidade natal, um pacato lugarejo no interior da Coreia do Sul, até que o tempo fique bom, novamente. Vai em busca de acolhimento, por tempo indeterminado.
Pela mãe ter sido julgada por crime de assassinato e condenada à 7 (sete) anos de prisão, ela foi criada pela tia, Shim Myeong-yeo, escritora de renome, atualmente desencantada do seu ofício, que expõe sua angústia e decepção através do descuido com sua saúde e com a pousada onde mora, herança da avó de Hae-won. Os ânimos ficam tensos quando Hae-won começa a querem reerguer o local. Sua mãe aparece de quando em vez, sem ninguém saber, precisamente, o motivo. Monossilábica e distante, ela guarda distância da filha.
Diante deste clima frio e hostil, Hae-won se aproxima de Im Eun-seop (Seo Kang-jun) seu vizinho e ex-colega de escola, que fundara a livraria Boa Noite, em uma casa abandonada, próxima à pousada e cedida pelos proprietários, onde ele, também, dirige o Blog de Boa Noite com fragmentos compartilhados de sua vida numa comunidade online. Na livraria ele criou o hábito de reunir moradores locais, de todas as idades, para ler trechos de livros e se emocionar.
Aos poucos ela vai se reaproximando dos ex-colegas da escola, incluindo sua desafeto, uma amiga para quem revelou o segredo da mãe. Desta forma, entredentes passou a ser rejeitada pelos colegas, com exceção de uns poucos. Nesse reencontro um dos dilemas da série vem à tona: perdoar ou não a amiga. O que seria moralmente correto? Foi deslealdade ou um mal-entendido?
Muitos segredos da época da escola começam a ser revelados e, oportunamente, Hae-won faz uma retrospectiva de seus amores e desafetos. Eun-seop também guarda seus segredos: de sua origem na montanha misteriosa e, também, de seu afeto por Hae-won.
Aos poucos, ela e Eun-seop ficam mais próximos, mas ele se mostra reticente a se declarar abertamente. Já Hae-won declara seu amor a ele e a resposta é seca: tudo bem. Entretanto, no encontro do grupo literário, a leitura do Livro O Pássaro Azul a indagação sobre se a felicidade é algo que precisamos rodar mundo para encontrar ou se está bem aqui, na nossa casa. Essa seria a segunda reflexão da série: o que é a felicidade? O que nos faz feliz?
A tia, pressionada pela situação financeira e influenciada pelo editor Shin Yeong-chun, seu amigo e antiga paixão da juventude e que nunca entendeu a separação repentina deles, aceita o desafio de escrever sobre sua vida a partir da faculdade. A expectativa de Shin Yeong-chun era que ela revelasse a verdade os fatos que a fizeram tomar a decisão de romper com ele, abruptamente.
De fato, o livro é lançado e causa um enorme impacto na vida de Hae-won.
Perplexo com as revelações, editor indaga a escritora sobre a verdade dos fatos, ao que ela confessa que sim, são verdadeiros. Entretanto, afirma que literatura é ficção e que ele não deveria estar perguntando isso a ela. Contudo, a linha tênue entre ficção e verdade na vida e na literatura é tensa como a corda sonora de um violão ou um cello. Qual o seu peso nas relações afetivas?
Nessa produção primorosa, suspense e mistério sobre uma tragédia familiar até então encoberta, sob o argumento de proteger as pessoas envolvidas, só causara sofrimento e dor. Um desfecho surpreendente nos aguarda e, como num bom thriller psicológico, paradoxalmente ambientado nas calorosas casas de madeira num pequeno lugarejo próximo de Seul, uma montanha que guarda histórias, um rio passando pelo vale deslumbrante e muitos segredos a serem revelados. Amizade, lealdade, solidariedade, amor, felicidade e muita pipoca.
Se você não tem pressa, vale a pena assistir. Um reconfortante elogio à literatura.
Autora: Ana M. Otoni Mesquita
Psicóloga pela PUCRGS,
Doutora em Ciências pela Ensp-Fiocruz e mestre em Psicologia Clínica pela Puc-Rio
Natural do Rio de Janeiro, antes de realizar o curso de Formação de Escritores na Editora Metamorfose, foi Psicóloga Clínica e funcionária Pública da Saúde Estadual do RJ, com doutorado em Ciências pela Ensp-Fiocruz. Desde 2024 mora em Brasília e realiza sua produção profissonal online.
Publicou contos nas coletâneas são "As vidas que ninguém vê" e "Crianças Pequenas". Tem um gosto especial por escrever resenhas sobre séries coreanas e publicou algumas na Revista Intertelas, sobre assuntos dos países asiáticos com destaque para Irei quando o tempo estiver bom, que foi publicada, igualmente, na plataforma da Metamorfose.
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